Recordo
que certa vez, depois que o Led Zeppelin se dissolveu, Robert
Plant declarou que não sabia o
que a letra de Stairway to Heaven queria dizer.
Assim também com muitos jovens da década de oitenta, que foram
adolescentes nos setenta, e com jovens da década de setenta,
que adolesceram nos sessenta, e cometeram poesias, músicas,
teatros e todos os hibridismos nas artes. Acho meus
desenhos-textos (ver Antigamente e Viraram Raridades) uma barafunda de
transgressões da linguagem misturadas com lirismos tardios,
contestação da sociedade vista da janela niilista do autor da
crítica, estranhas fusões de solidariedade aos oprimidos com exibicionismos, discursos em prol de
horizontalidades anarquistas feitos por jovens que não se
permitiam duvidar de si e de sua verdade libertária gritada de
dedo em riste no rosto de outros. Uma barafunda muitas vezes bela por mais canhestra
que fosse. Era, de qualquer modo, ao seu modo, o grito da vida
frente a algo que ontem e hoje (hoje, Brasil, maio, 2019) é
macro e é horrendo, sistematicamente horrendo. É horrendo
porque não é acidente de juventude, é projeto, intenção
reiterada. Em confronto com o horrendo, o canhestro se torna
até lindo. Talvez mais do que a barafunda das formas e da
confusão que germinava nas cabeças, valesse mesmo era a
pulsação, a vida.
O Gato Preto de Três Olhos Verdes foi meu primeiro
caderno de algo parecido com poesias, publicado pelos jovens libertários,
talvez às vezes um pouco autoritários, ingênuos, confusos,
talvez lúcidos, bonitos, do grupo teatral Ói Nóis Aqui Traveiz.
Paulo Flores, Jussemar Weiss e demais meninos, meninas: um
longo abraço através do tempo.
No país que não lê e mais ainda não lê literatura e ainda mais
não lê poesia, fui um caso raro de algo parecido com poeta que
viu três mil exemplares de seu primeiro caderno serem
vendidos, contando com as versões em que o caderno, antes de
ter capa e ser mesmo caderno, era folhas soltas enfiadas em
envelopes pardos com estampas feitas por serigrafias em cor
bordô. Foi noticiado com generosidade pelos jornais: as
reproduções de matérias em Antigamente demonstram. Obrigado,
antigos jornalistas. Foram todos enganados pelo marketing contracultural que eu e meus amigos fazíamos? Acho que sim,
inclusive eu e meus amigos. Fomos todos enganados por nós
mesmos. E talvez a beleza esteja bem aí, nesse equívoco todo.
Era pulsação.
Pena que não sobrou nenhum dos primeiros envelopes. Quem foi o
autor ou autora das serigrafias? Que falta de gratidão a
minha, que não guardei o nome, sequer a fisionomia da pessoa.
Talvez o melhor dos envelopes fossem as serigrafias cor de
vinho tinto que os embelezavam. |
Escada para o Paraíso
Robert Plant, Jimmy Page
(Tradução de Rebeka Fuks)
Há uma mulher que acredita
Que tudo o que brilha é ouro
E ela vai comprar uma escadaria para o paraíso
E quando chegar lá, ela sabe que
Se as lojas estiverem todas fechadas
Com uma só palavra ela conseguirá o que foi buscar
E ela vai comprar uma
escadaria para o paraíso
Há uma placa na parede
Mas ela quer ter certeza
Pois você sabe que às vezes as palavras são ambíguas
Numa árvore perto do riacho
Há uma ave cantora que canta
Às vezes todos os nossos pensamentos são inquietantes
Isso me faz pensar
Isso me faz pensar
Eu sinto uma coisa ao
olhar para o oeste
E meu espírito chora por estar indo embora
Em meus pensamentos, eu vi anéis de fumaça através das árvores
E as vozes daqueles que ficam olhando
Isso me faz pensar
Realmente me faz pensar
E sussurram que em breve
Se todos entoarmos a canção
Então o flautista nos levará à razão
E haverá um novo dia
Para aqueles que resistirem
E a floresta irá ecoar com risadas
Se houver um alvoroço na
sua horta
Não se assuste
É só a limpeza de primavera para a rainha de Maio
Sim, há dois caminhos que você pode seguir
Mas a longo prazo
Ainda há tempo para você mudar de direção
E isso me faz pensar
Sua cabeça está
cantarolando e não vai parar
Caso você não saiba
O flautista quer que você se junte a ele
Querida senhora, está ouvindo o vento soprar?
E você sabia
Que sua escadaria repousa no vento sussurrante?
E enquanto seguimos pela
estrada
Com nossas sombras maiores do que as nossas almas
Vemos uma senhora que todos nós conhecemos
Que emite uma luz branca e quer mostrar
Como tudo ainda vira ouro
E se você ouvir com muita atenção
A canção enfim chegará até você
Quando tudo for um e um for tudo
Ser uma rocha e não rolar
E ela vai comprar uma
escadaria para o paraíso |